Fim da neutralidade de rede nos EUA gera dúvidas no Brasil
Agora, algumas empresas de telecomunicação já falam sobre uma flexibilização da neutralidade no País.
A revogação da neutralidade de rede nos Estados Unidos, durante a última semana, tem gerado questionamentos quanto aos impactos que poderão chegar ao Brasil. Votado em 2015, o Marco Civil da Internet previa questões similares quanto à liberdade democrática de conexão. Agora, algumas empresas de telecomunicação já falam sobre uma flexibilização da neutralidade no País.
De acordo com uma nota emitida após a votação da Comissão Federal de Comunicações dos Estados Unidos (FCC), o Sindicato Nacional de Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (Sinditelebrasil) defendeu a flexibilização das regras a fim de garantir o que chamou de “neutralidade inteligente”.
“O setor de telecomunicações é a favor da neutralidade da rede aplicada de forma inteligente, permitindo às empresas gerenciar o tráfego nas suas redes com o objetivo de melhorar a qualidade e a experiência do usuário. Não deveria haver regra para interferir na gestão do tráfego das prestadoras de telecomunicações. Bastaria a lei reforçar que é assegurado aos interessados que o uso das redes se dê de forma não discriminatória, garantida pela fiscalização da agência reguladora”, pontua o sindicato.
À Agência Brasil, o Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações informou que, apesar da revogação nos Estados Unidos, não há pretensão por parte do governo federal em alterar a atual regulação no País. “O Marco Civil é uma conquista da sociedade brasileira e somos contra mudanças nessa legislação. Evoluções da tecnologia podem levar a mudanças na lei e aprimoramentos, mas não é esse o caso.”
RETROCESSO E PREJUÍZO AOS USUÁRIOS
Para especialistas e organizações da sociedade civil, não há relação entre a decisão da FCC e o quadro brasileiro. Segundo a conselheira do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI), Flávia Lefèvre, as legislações dos dois países são bastante diferentes. Enquanto lá o acesso à internet é tratado como serviço de telecomunicações, aqui é considerado serviço de valor agregado, não cabendo sua regulação à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
De tal maneira, caso a revogação do Marco Civil entrasse em pauta, a mudança na lei seria bem mais complexa do que nos Estados Unidos. “Aqui o custo político é maior. Não é fácil mexer no Marco Civil, uma legislação de referência internacional e um texto construído democraticamente por um longo processo”, avalia o pesquisador do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Rafael Zanatta.
Outra questão levantada pelos dois especialistas à Agência Brasil é o retrocesso caso houvesse uma revogação ou mesmo a flexibilização da legislação. Se por um lado as empresas buscam isso para aumentar seus lucros e ganhar capacidade de vender pacotes diferenciados, por outro para os usuários tal cenário poderia trazer prejuízos.
“Se você quebra a neutralidade em um país com condições tão desiguais como é o caso do Brasil, em que só temos 50% dos domicílios conectados e a maioria pelo celular, a diferença pode se aprofundar com prejuízos claros para finalidades de inclusão digital e universalização do acesso à internet, objetivos previstos em lei e que devem, portanto, ser respeitados”, alerta a conselheira do CGI.
*Fonte: Agência Brasil