Artur Luiz Andrade   |   28/04/2015 20:54

Guerra de aéreas americanas e árabes preocupa turismo

Aéreas americanas acusam empresas do gollfo de concorrência desleal pois ganhariam subsídios bilionários dos governos de seus países; árabes rebatem e dizem que americanas querem acabar com concorrência

LAS VEGAS - O Capa Americas Aviation Summit, que ocorre em Las Vegas, deixou para o segundo dia o debate mais esperado: as companhias aéreas americanas, lideradas por American, Delta e United, têm razão em pedir uma consulta ao acordo de céus abertos entre os Estados Unidos e os Emirados Árabes e o Catar? A alegação é que as empresas do golfo receberam bilionários subsídios governamentais e entram nos Estados Unidos atuando de forma predatória. "Estamos concorrendo com países e não com empresas aéreas. Nosso problema não é com a Etihad, de quem somos parceiros, Qatar ou Emirates, e sim com a política de governo atrelada a subsídios a essas empresas aéreas", disse Will Ris, vice-presidente de Assuntos Governamentais da American Airlines.

Para Jim Callaghan, conselheiro geral e secretário da Etihad Airways, o pedido e a acusação não fazem sentido. "Não há provas de atuação predatória ou de prejuízo às companhias americanos. Nós voamos para destinos onde elas não querem voar. Trata-se de uma crítica a três concorrentes fortes e aí querem dizer ao governo que se trata de problema na política de céus abertos", afirmou. Segundo Callaghan, as empresas árabes não receberam subsídios dos governos e sim investimentos, como muitas companhias no mundo. "Já vi esse filme antes. Quando estava na Ryanair também houve acusações, pois se tratava de uma empresa que ameaça o modelo das tradicionais".

Quem tem razão? O que fará o governo americano? Pedirá uma revisão do acordo ou determinará que a concorrência continua livre no país? Esse pedido abrirá brecha para que outras nações queiram rever seus acordos? As parcerias europeias das americanas, que sofrem bem mais com a concorrência árabe (no caso das americanas as malhas são até complementares, tanto que a Etihad é parceira da American), também entrarão na briga? E o passageiro? Será beneficiado ou prejudicado com essa guerra aberta?

Participaram do debate, moderado por Kenneth Quinn, da Pillsbury Law, Lee Moak, da entidade Americans for Fair Skies (a favor das americanas), Ben Hirst, vice-presidete e chief legal officer da Delta Air Lines, os já citados Will Ris e Jim Callaghan, pela AA e Etihad, Rush O´Keek, vice-presidente da Fedex Express (claramente contra a revisão do acordo de céus abertos, o que poderia prejudicar o setor de cargas), e Roger Dow, da US Travel Association, e David Scowsill, do WTTC, ambos a favor da política de céus abertos e de Visa Waiver, reafirmando que seria um retrocesso fechar os céus americanos.

Veja a seguir os principais pontos levantados por cada parte:

AMERICANAS
American Airlines, Delta e United se uniram, o que é raro, depois de uma investigação "em lugares obscuros" que teria descoberto documentos não divulgados de subsídios dos governos árabes à Emirates, Etihad e Qatar Airways, as duas primeiras dos Emirados Árabes Unidos e a terceira do Catar.

Segundo Ben Hirst, da Delta, a Qatar recebeu subsídios de US$ 16 bilhões e a Etihad de US$ 17 bilhões, com provas também de que a Emirates age como braço do governo. "Queremos negociar o fim dos assentos subsidiados nos céus americanos", disse.

"Não se trata de uma companhia competindo com outra e sim de empresas americanas, que investem bilhões de dólares em melhorias de produtos e infraestrutura do próprio bolso, e não com dinheiro público, brigando com uma política de governo que subsidia suas companhias aéreas", afirmou Will Ris, da AA. "Não nos opomos a subsídios ou empresas estatais, mas sim a elas terem acesso injusto aos céus americanos. Isso em qualquer setor, não apenas na aviação".

Tanto Ris quanto Hirst e Moak citaram o presidente da Emirates, Tim Clark, que estava confirmado, mas não compareceu ao evento, e que teria dito que esse é um assunto para ser tratado pelos governos. "Queremos que os governos sentem e resolvam", disse Lee Moak. As aéreas árabes não querem nem sentar e dizem que preparam um estudo econômico para mostrar que somam e não são predatórias. Se os dois governos sentam (ou três) abre-se um precedente de desconfiança de quebra do acordo de céus abertos e isso envolve política internacional dos envolvidos.

E por quem os maiores incentivadores da política de céus abertos decidiram repensá-la? "Não sabíamos o nível de subsídio que era dado a essas companhias", afirmou Will Ris, que ainda considerou leviana a tese levantada pelo moderador de que as americanas queriam segurar as árabes até que melhorem seus produtos e possam concorrer de igual para igual. Hirst, da Delta, citou pesquisa da Iata que mostra a satisfação dos passageiros de executiva da empresa, equivalentes aos da Etihad e Ris reafirmou que as americanas investem em melhorias e com dinheiro próprio. "O consumidor adora um produto de qualidade a preço baixo. Mas a indústria não pode aceitar concorrência predatória", foi uma das frases de Ris. Segundo ele, as americanas estão alertando cedo, enquanto as árabes são pequenas nos EUA, para que o problema não cresça e chegue a proporções maiores.

AS ÁRABES
O conselheiro da Etihad foi bastante enfático: "Não recebemos subsídios. Isso é coisa de empresas dominantes temendo novos concorrentes". Ele ressaltou que Delta, United e American nao são apenas as três maiores empresas aéreas dos EUA, mas do mundo, controlando 50% da aviação global. "Os Estados Unidos têm 140 acordos de céus abertos, agora elas querem fechar as portas para quem ameaça sua hegemonia?".

Ele exemplificou que as empresas árabes atuam em mercados e destinos ignorados pelas americanas e que ao chegarem aos EUA alimentam os voos domésticos das mesmas. "Voei para Las Vegas via Los Angeles, em voo da Etihad a partir de Abu Dhabi. Foram cerca de 15 horas e os 215 passageiros, ou seja, 95% de ocupação, vieram de 18 destinos, 16 dos quais não operados pelas americanas. Ou seja, eles teriam de fazer duas ou três escalas para chegar a Los Angeles. E 31 deles se conectaram com voos domésticos das empresas americanas. Por mês entregamos 25 mil passageiros às companhias americanas em voos domésticos. Onde está a evidência que prejudicamos essas empresas?".

Callaghan citou o exemplo da Índia, "abandonada pelas americanas". Com a entrada das árabes na Índia as americanas perderam 4,4% de share, mas ganharam 18% de passageiros, segundo ele. E a operação das mesmas, é mínima frente às demais empresas. Para se defender dos chamados investimentos recebidos pelos governos árabes, ele citou o Chapter 11, processo por que passaram todas as americanas envolvidas, e que zera as dívidas das empresas em recuperação, além de permitir demissões e redução de salários. "Isso também é um benefício e não estamos aqui reclamando disso".

O vice-presidente da Fedex diz que a empresa nem quer ouvir falar em rever o acordo de céus abertos. "Nós e a UPS somos as empresas americanas que mais operamos no golfo. A Fedex tem hub em Dubai, com 50 voos por semana. A Delta tem uma operação, a United outra... Os céus abertos são fundamentais para nosso negócios".

PELO TURISMO
"Não me interessa como os turistas chegam aos Estados Unidos, se com empresas árabes, africanas, europeias ou americanas. Queremos mais turistas aqui, pois o governo já sabe que isso significa movimentar nossa economia, criar mais empregos, fortalecer nossas cidades. Queremos empresas americanas fortes, mas seria um retrocesso rever a política de céus abertos. Queremos mais facilidades e não entraves. Queremos o fim do visto para brasileiros, chineses e indianos...", resumiu o pensamento da indústria de viagens e turismo o presidente da US Travel, Roger Dow. Tanto ele quanto David Scowsill temem que outras nações façam o mesmo e os céus americanos acabem se fechando ao invés do oposto.

"Depois do 11 de setembro, os EUA perderam US$ 600 bilhões em receita por tratarem os visitantes como potenciais terroristas. Rever a política de céus abertos é retrocesso para uma indústria que gera milhões de empregos no país", disse Scowsill.

Uma representante da Oracle na plateia chegou a questionar que se o governo atender o pedido das americanas e segurar o crescimento das árabes, o passageiro não seria prejudicado com menos oferta. As aéreas americanas garantem que não. As árabes dizem que sim. E você o que acha? Consegue tomar partido nessa guerra de gigantes?

Veja abaixo mais fotos do debate.

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