Câmara debate taxa de juros e impacto da dívida pública
Economista destacou que despesa com juros este ano deve ser de R$ 700 bilhões
A Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara dos Deputados e o Centro de Estudos e Debates Estratégicos (Cedes) defenderam que o Banco Central diversifique suas consultas externas sobre inflação e atividade econômica, ouvindo pessoas ligadas a outros setores e não, de forma majoritária, o mercado financeiro. Segundo o assessor do Ministério da Fazenda, Fábio Terra, que participou com economistas de audiência pública na Câmara na quarta-feira (12), a atual situação pode enviesar a avaliação da autarquia sobre o nível de taxa de juros necessário para controlar a inflação.
“O Boletim Focus é respondido por mais ou menos 150 instituições, sobretudo do mercado financeiro. Ótimo que se ouça e é preciso ouvir o mercado financeiro porque ele é parte da economia; mas não somente, ou não preponderantemente”, disse o assessor. O professor da PUC São Paulo, Antônio Lacerda, afirmou que a mesma dinâmica ocorre com as reuniões que o Comitê de Política Monetária faz com economistas de fora da instituição. Já o professor da FGV Nelson Marconi comentou a escolha da diretoria do BC, que seria chamada de “porta giratória” em alguns círculos, uma vez que os diretores vêm do mercado financeiro e acabam indo para o mercado financeiro quando saem.
Marconi também chamou de “erro” a autonomia do Banco Central, porque partiria do pressuposto de que, para funcionar bem, um órgão público precisaria estar blindado de interferências políticas. “Quando ele define a taxa de juros, ele está influenciando na distribuição de renda do País. E tem um componente político forte nisso”, ressaltou.
Dívida pública
A audiência teve como tema o impacto da taxa de juros na dívida pública e o professor Antônio Lacerda destacou que a despesa com juros este ano deve ser de R$ 700 bilhões, enquanto o Orçamento da União prevê apenas R$ 70 bilhões em investimentos. Nelson Marconi apontou que as empresas também não têm como fazer investimentos com uma taxa de juros real de 8% como ocorre hoje.
“Como é que uma empresa que quer investir na esfera produtiva vai conseguir ter um retorno maior que 18%, que é o custo que ela tem para tomar capital no mercado financeiro para financiar o giro? Não tem negócio que sobreviva desta forma”, afirmou. Marconi sugeriu aos parlamentares que cobrem do BC a observância da Lei Complementar 179/21, que concedeu autonomia à autarquia, quando ela fala que a instituição deve “suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego”.
Os economistas ressaltaram a importância da política fiscal para a definição das taxas de juros, mas afirmaram que o nível atual, de 13,75% ao ano, é incompatível com a sustentabilidade das próprias contas públicas. Antônio Lacerda afirmou que a inflação atual não ocorre porque as pessoas estão comprando muito. Se esta fosse a causa, ao elevar o preço do dinheiro, a atuação do BC poderia frear a alta.
Todos citaram pressões inflacionárias relacionadas à oferta de produtos como a Guerra na Ucrânia, elevação do preço de matérias-primas, e consequências da pandemia sobre a produção mundial.
Para Antônio Lacerda, o BC deve mudar de rumo porque a manutenção das taxas de juros altas pode ter efeitos perversos sobre as empresas, o que também afetaria os bancos: “Aqueles que estão na ponta devedora, que ampliaram a sua exposição ao crédito, estão sentindo uma dificuldade muito grande. Então estamos diante de um risco de uma crise eminente de crédito. Ou seja, além dos impactos diretos sobre a dívida pública, haverá esse potencial impacto de um agravamento da crise provocado pela situação de crédito das empresas e talvez até afetando a situação de algumas instituições financeiras”, afirmou.
Exemplo do Japão
Lacerda apresentou um gráfico que coloca o Brasil isolado no mundo com um custo de rolagem da dívida pública de 7% do PIB, tendo uma dívida de 70%. O Japão tem uma dívida de 260% do PIB, mas o custo anual de financiamento é menor que 2%. O deputado Florentino Neto (PT-PI) disse que as taxas de juros para as pessoas físicas são ainda mais proibitivas. E sugeriu a limitação dos juros dos cartões de crédito como aconteceu com o cheque especial em janeiro de 2020, quando o BC definiu 150% ao ano como taxa máxima: “Nós não podemos nos calar e aceitar que hoje o cidadão brasileiro esteja pagando 400% no crédito rotativo dos cartões de crédito”. Para o assessor do Ministério da Fazenda, desde 2010 vem sendo elevada a competitividade no mercado de crédito, o que ainda deve provocar mudanças nas taxas para as pessoas físicas.
*Fonte: Agência Câmara